46 - ENTÃO PENSO ... E ME LEMBRO ...
A vida pastoral não pode ser exercida por meros
executivos eclesiásticos. Estes nunca têm tempo para as pessoas; aliás, para
eles, o que estraga a igreja são as pessoas que nela
congregam...
Quando se é pastor por chamado e se entende que o
serviço de Deus ao povo é uma das prioridades, então as marcas que estas deixam
na alma do obreiro são para sempre.
E como é triste descobrirmos o paradeiro de muitas
pessoas que conosco congregaram, conosco trabalharam, conosco conviveram,
servindo a Deus e participando do serviço ao Senhor.
Com o império das redes sociais é fáicil
encontrá-las. E as vejo às vezes, quando alguém aceita amizades delas em redes
onde também estou inscrito.
Vejo aquela moça. Tão meiga, tão adolescente, tão
dedicada, hoje envolvida com drogas e com um casamento destruído. Penso: onde
foi que eu errei? E me lembro: as escolhas eu não pude fazer por ela, apenas
indicar-lhe o caminho.
Vejo aquele jovem instrumentista. Ensinei-lhe as
primeiras posições. Onde o vejo hoje? No mundo, cheio de piercings, brincos,
tatuagens, não há um único símbolo que lembre que um dia ele fez a boa confissão
diante de Deus e comprometeu-se a ser fiel até a morte. E imagino: o que Deus
pensa de alguém assim? E me lembro: Deus nunca deixou-se escarnecer; portanto,
aquele louvor e aquela interpretação pública nunca iludiram ao
Senhor.
Vejo aquele menino, hoje pai de família. Antes
pacífico, gentil, singelo, querido ao extremo. Hoje com armas e fuzís sobre a
cintura e os ombros. Lembro-me das canções que cantava e dos estudos bíblicos
que fazia. E me indago: foi isso que lhe ensinei? E me lembro: nem todo o que
diz Senhor, Senhor, é de fato do Senhor. Para Deus não vale cantar, ensinar,
expulsar demônios no nome de Jesus; no Céu o bem-vindo contemplará: "os que não
praticam a iniquidade".
Vejo aquele pregador. Como pregava bonito. Achava
defeitos em tudo e em todos; muitas vezes busquei mostrar-lhe que o caminho era
proclamar as virtudes do Senhor e não as suas próprias. Agora o vejo. Faz com a
mão o símbolo do Diabo e mantém uma página escura e satânica, nem de longe
semelhante ao jovem adolescente a quem ensinei a Palavra do Senhor. E penso: por
que as pessoas mudam quando amadurecem, ficam diferentes com a passagem do
tempo e nunca é para melhor? E me lembro: o servo é provado pelo fogo e o tempo
mostrará sobre o que edificou, se sobre ouro, pedras preciosas, madeira, feno e
palha.
Como disse no começo, a vida pastoral não pode ser
exercida por um mero executivo. Esse não liga para o povo, não chora pela ovelha
perdida, não festeja a conversão do pecador, não se preocupa com ninguém além de
si mesmo. Pastorado tem que ser feito por gente que não teme cheirar a ovelha,
cheirar a bode, cheirar a animal (nem sempre tem-se só ovelhas, e só Deus
conhece os bodes presentes). Certamente que isso é analogia. O que se faz
necessário é que o pastor desça da cadeira do gabinete e vá para o meio do povo.
Que abrace a velhinha solitária, que gaste tempo com o idoso enfermo; que
converse com a juventude transviada, que pegue a criancinha no colo, que
continue a investir tudo o que tem no bem da igreja, na pregação do evangelho,
no "assim diz o Senhor".
Não sabemos quem são os eleitos, os salvos, os
verdadeiramente cristãos. Só Deus e as próprias pessoas as conhecem. Então
devemos continuar a semear. Sementes ainda cairão na estrada e desaparecerão.
Sementes ainda nascerão nas rochas e morrerão. Outras nascerão no espinheiro e
serão sufocadas. Mas às vezes contemplamos algumas que cairam na boa terra.
Estas são tão maravilhosas, são tão consagradas, tão estáveis no Senhor, que
compensam todas as demais, alegrando coração do pastor que
semeia.
São lutas de pastor. Que Deus nos ajude a conviver com
elas, superá-las e nos manter com a "mente de Cristo", através da qual
pensaremos no que é lá do Alto e não nos sufocaremos com as angústias dos que
abandonam o caminho ao longo da jornada.
Wagner Antonio de Araújo
23 de março de 2013
Igreja Batista Boas Novas do Rodoanel, Carapicuíba,
São Paulo, SP
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