TROCA
INFELIZ
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Aquela era uma boa igreja.
Um auditório constante, boas programações, crentes relativamente fiéis. O pastor
iniciara o seu ministério e o período de lua-de-mel caminhava bem. Durou três
anos.
Com o tempo a festa deu
lugar à rotina. E os cultos de oração foram minguando. Eram cem pessoas, em
média. Caíram para cinquenta, trinta e, naqueles dias, oito ou dez crentes
apareciam.
Cidade pequena, todos se
conheciam, não havia uma justificativa plausível. O pastor passou a usar as
redes sociais, os cultos, o celular e toda forma de convite, instando com todos
para que viessem ao culto intersemanal, um culto precioso, com ênfase à oração.
As pessoas desculpavam-se.
"Tenho faculdade". "Tenho que dar banho nas crianças". "Trago trabalho para
casa, tenho que terminá-lo". Havia aqueles que eram mais sinceros: "não quero
ir". "Perda de tempo". "O que eu ganho com isso?".
Alguns amigos de facebook
daquela igreja escreviam aos membros sobre os artigos postados pelo pastor, um
reconhecido homem de oração. Para surpresa deles, os membros não liam a
literatura dele. "O profeta não tem honra na sua própria casa". E o pastor
entristecera-se, pois para ele a frieza espiritual, conquanto explicada, não
tinha justificativa. E o encontramos orando naquela noite, onde ele participou
do culto sozinho (a zeladora não aparecera):
"Senhor,
quando vim para esta igreja pensava manter reunido o povo ao redor de Tua mesa.
E assim vivemos por um tempo, mas agora tudo é frio, tudo é difícil. As pessoas
não oram, não buscam a Tua face. Elas estão tranquilas, sem aflições, sem
consciência de que têm feito uma troca infeliz. Oh, Senhor, não permita que o
Teu Nome seja desonrado neste lugar. Traze o Teu povo aos Teus pés, CUSTE O QUE
CUSTAR, eu imploro! Em nome de Jesus. Amém".
Passaram-se três meses. Uma
imobiliária da capital instalou-se à margem da avenida principal. Trouxeram uma
banda de música, carro alegórico, um circo e muita propaganda sonora e
panfletagem. Marcaram um show e grande parte da igreja deixou o culto para
assistir aos artistas de sucesso. Eles anunciaram um grande empreendimento. Uma
gleba inteira, ao lado do último bairro da zona norte, fora liberada para
loteamento (segundo eles). Esta imobiliária encampou-a e fez um projeto de "um
lote para cada família". Era um milhar de lotes naquela montanha, com promessas
de água, luz, telefone, esgoto, praça principal com padaria, farmácia,
minimercado e linha de ônibus. E a grande vantagem: baratíssimo. A marquete do
loteamento era linda, em três dimensões. Um vídeo fantástico mostrava a alegria
dos moradores, a segurança, o lago central, as árvores, a pracinha, as crianças
a sorrirem!
Aquilo cativou e fisgou a
atenção e o bolso de muita gente. Foi um tumulto geral. Todos comentavam a
oportunidade. "Vou tirar todo o meu dinheiro da poupança e comprar um lote para
cada filho!"; "Enfim direi adeus ao aluguel!"; "Vou investir tudo o que tenho e
vou fazer casas para a renda". E o povo inscrevia-se às dezenas. O dinheiro saía
do banco e entrava na dita imobiliária. Cada venda disparava uma campainha e
todos festejavam, lançando serpentinas e confetes, buzinando e apitando com
alegria. Os novos proprietários saíam dali e iam à lanchonete do Pedro, em
frente, festejar. Pedro nunca ganhara tanto dinheiro! Aliás, o que ganhou nesse
período investiu em dois lotes.
Lá na igreja, porém, no
culto de oração, os poucos irmãos oravam. Houve um sentimento generalizado,
entre os que clamavam, de que aquilo era uma ilusão. E pediam ao Senhor para ter
misericórdia. Várias famílias procuraram o pastor e pediram a sua opinião. O
pastor, ao púlpito, disse: "Irmãos, tomem cuidado com
promessas de quem nunca viveu aqui. As coisas não são baratas e fáceis assim;
aguardem esclarecimentos das autoridades; não entrem em embrulhos dos quais se
arrependerão amanhã." Um membro, espírito de porco, interrompeu a
pregação no final, dizendo: "O senhor é que é bobo,
pastor! Poderia com a poupança da igreja comprar uns 5 lotes e construir uma
catedral no bairro novo! Se tivesse visão esta igreja prosperaria!"
O pastor, incomodado com o desrespeito, respondeu: "A visão à qual o irmão me
insulta, é uma visão de Deus ou do Diabo? O irmão já consultou a vontade do
Senhor?" O homem saiu rindo porta afora, acompanhado do riso contido das
famílias. Conselhos de pastor
são como orientações de pais: no início acham que são conselhos retrógrados e
errados, de gente velha e sem inteligência. No caso do pastor, um homem sem
visão e decadente. No culto de oração, entretanto, ninguém comprou lote nenhum.
Sentiam que algo não estava correto.
E numa noite, depois de
instar mais uma vez para que os membros viessem ao culto, e sem nenhum resultado
além do normal (os fiéis eram sempre constantes e os mesmos), o senhor trouxe um
choro generalizado entre os intercessores. Sentiam que uma grande desgraça
aconteceria. Oraram. pedindo misericórdia. Terminaram o culto aflitos. Foram
para as suas casas.
Não tardou muito e
escutaram um grande barulho: caminhões em movimento, marteladas, madeiras
empilhadas e muito, muito vozerio. Pela manhã, ao passarem em frente à
imobiliária, a surpresa: não havia mais nada! O barulho que ouviram fora dos
caminhões de mudanças. Levaram o estande, levaram a casa pré-fabricada onde
funcionava o escritório, levaram as propagandas, levaram tudo! Só sobrou o
terreno (e ainda cheio de lixo!).
Houve um corre-corre pela
cidade, gente desesperada à procura de informações. Ninguém sabia o que
acontecera e para onde havia ido a empresa. Os telefones estavam mudos ou fora
de área. Em uma semana chegou a notícia: não havia imobiliária alguma; tudo não
passou de um golpe. Bandidos bem preparados formaram a ilusão e, através dela,
venderam papéis sem qualquer valor. A prefeitura, desconfiada e não tendo
informação nenhuma de liberação de gleba, mandou investigar. Alguém da justiça,
corrupto, alertou os criminosos e, antes que chegasse a força-tarefa de
policiais para o confisco e a apreensão de tudo, fugiram, levando o dinheiro de
quase toda a população.
Gritos de desespero. "Meu
Deus, era tudo o que eu tinha!"; "E agora, onde vou morar? Vendi a minha casa e
estou na rua!"; "Era a poupança da faculdade dos meus filhos; como estudarão?";
"Estou sem um tostão!". Diversos enfartados, transferidos para a capital. Gente
que se atirou no córrego, outros que tentaram o suicídio na estrada movimentada.
Perderam o patrimônio de anos, investiram tudo em absolutamente
nada.
E os crentes, membros da
igreja, chorando, foram buscar a Deus no culto de oração. Sim, os mesmos que não
o frequentavam, que achavam perda de tempo, que julgaram ter coisas mais
importantes para fazer. Agora foram apelar a Deus, para que lhes devolvesse o
dinheiro de alguma forma. Os fiéis estavam tristes e surpresos, mas compreendiam
que a dor desses irmãos era merecida.
O pastor, também triste,
mas absolutamente convicto, levantou-se na pregação e disse ao auditório de
quase 200 pessoas:
"Uma
quarta-feira diferente, está quase todo mundo aqui. Sejam bem-vindos! A vocês só
tenho uma palavra: Deus lhes castigou. Pesados foram na balança e foram achados
em falta. Os seus pecados lhes acharam. A fatura foi cobrada. Não culpem ao
Senhor por isso, pois quem semeia na carne, da carne colhe a corrupção. Alguém
insultou-me no culto, dizendo que a igreja não tinha visão. Agora eu lhe digo,
irmão em Cristo: a sua visão era de quem, de um homem espiritual ou de um tolo?
Onde está o seu dinheiro? Perdeu tudo, não é mesmo? Pois bem. Já o dinheiro da
igreja está bem guardado, pois para quem coloca a Deus em primeiro lugar, o
Espírito Santo lhe dá discernimento para não cair em armadilhas. Teria sido
melhor procurarem o culto de oração de forma preventiva, buscando uma vida digna
e vigilante antes de fazerem asneiras. Hoje buscam ao Senhor em desespero, de
forma remediatória, clamando por uma solução. Não é o ideal. Mas se o fazem com
sinceridade, sejam bem-vindos, e confessem os seus pecados a Deus. Assim disse
Isaías, e assim digo para vocês: Vinde então, e arrazoemos, diz o Senhor: ainda
que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a
neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a branca lã.
(Is 1:18)"
De fato o povo, cabisbaixo
e em lágrimas, veio à frente, chorando e lamentando, pedindo a Deus perdão pela
inversão de valores. Trocaram o eterno pelo material. Trocaram o culto pela
trivialidade particular. Trocaram a sabedoria de Deus pela sabedoria humana. Não
oraram para tomarem decisões; agora amargavam uma perda incomensurável, difícil,
constrangedora.
Mas, aos poucos, com a
graça de Deus, e com muitas custas advocatícias, conseguiram recuperar parte do
prejuízo de tanta imprudência. Mas a maior recuperação que conseguiram foi na
fé, pois entenderam à dura custa, de que quem troca a
Deus pelo viver na carne faz uma troca infeliz e paga uma fatura cara pelo resto
da vida. Aqueles crentes aprenderam a
lição.
E você? Como vai a sua vida
de oração? Há quanto tempo não frequenta um culto dedicado a esse fim? Tem
deixado as coisas de Deus de lado e busca uma boa justificativa para apaziguar a
consciência que o Espírito Santo constrange em você? Cuidado. O seu pecado lhe
achará. Vigie. Ore. E volte ao primeiro amor.
Wagner Antonio de
Araújo
20/07/2017
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