quarta-feira, 8 de julho de 2020

memórias literárias - 903 - QUERO OUVIR-LHE

QUERO
OUVIR-LHE
903
 
Era mais um culto de domingo à noite, dos inúmeros que dirigira e pregara. Sua congregação era pequenina e ele já idoso. Muitos o abandonaram ao longo do ministério, mas ele não desistira. Continuava a pregar, a dirigir, a pastorear. Ele amava a igrejinha onde servia ao Senhor Jesus Cristo.
 
Naquela noite percebeu um automóvel diferente no estacionamento. Dele desceu um senhor bem vestido. Olhou bem com seus óculos e, depois de esfregar os olhos para não duvidar do que via percebeu que era o grande evangelista Justino Macário, que arrebatava estádios cheios com sua prédica tão envolvente e poderosa, que viajava pelo mundo inteiro em busca de almas perdidas.
 
As pessoas olharam atônitas e perceberam que ele viera para participar do culto. O pastor saiu do seu gabinete, anexo à plataforma da capela, e foi falar com ele.
 
- Dr. Justino?
 
- Pr. Porfírio?
 
- Sim, sou eu! A que devo a honra de sua visita, Dr. Justino?
 
- Eu estava na cidade e, como não tenho conferências nesta noite decidi ouvi-lo.
 
- Eu agradeço, mas me sinto um tanto desconfortável!
 
- Mas por que?
 
- Porque há muitas igrejas aqui na região, disponíveis para que o senhor participe do culto e escute bons sermões. Eu sou apenas um pregador local.
 
- Pr. Porfírio, há muitas igrejas sim, mas nenhuma que tenha um Pr. Porfírio no púlpito. E eu vim para ouvir-lhe.
 
- O senhor já me conhece?
 
- Mas é claro! Quem nunca ouviu algum sermão de seu canal no youtube? Eu os ouço sempre entre uma viagem e outra! E digo-lhe: fazem-me bem e edificam a minha alma! Conheço muitos crentes que foram transformados com o poder de Cristo transmitidos pela sua pregação. 
 
- Meu Deus, eu jamais imaginei que alguém assistisse!
 
- Eu os assisto e me sentirei honrado se esquecer-se de que estou aqui e pregasse como todas as vezes costuma fazer.
 
- Mas se é assim eu quero oferecer-lhe o meu púlpito! Jamais tivemos alguém de sua envergadura nestas localidades!
 
- Se eu pregasse em seu púlpito perderia a bênção que vim procurar. Pastor, siga o seu trabalho. Eu vim ouvir-lhe.
 
Então o pastor pediu-lhe para que fosse ao gabinete por um minuto. E orou assim:
 
- Senhor, sinto-me tão desconfortável, sinto-me pequeno diante deste Teu grande servo. Ajude-me a fazer aquilo que Tu queres. Em Nome de Jesus. Amém.
 
O Dr. Justino completou:
 
- Senhor, ajuda o Pr. Porfírio a entender que o grande aqui é só o Senhor e que ambos, nos lugares onde Tu nos colocastes, somos apenas servos do Senhor. Que ele seja fiel e pregue o que colocaste em seu coração. Amém.
 
Abraçaram-se e o culto seguiu-se. Hinos, poesia, intercessão, coral, um culto tradicional.
 
E, no momento da pregação, o pastor disse:
 
- Sei que os senhores e as senhoras me perguntariam: o que esta celebridade está fazendo sentada no banco? Não deveria o Pr. Porfírio dar-lhe o púlpito ao Dr. Justino Macário? Amigos, eu tentei, Deus sabe que tentei! Mas ele disse que veio para ouvir e eu não consegui convencê-lo do contrário. Então, diante de Deus e de vocês, farei o que Deus quer que eu faça. Abramos as nossas Bíblias no texto de ....
 
E o pastor pregou com a graça que o Senhor lhe dera. Nem mais e nem menos. Sem citações que nunca poderia provar ou sem assuntos alheios ao texto. Ele pregou a Bíblia e nada mais. Ao final convidou a congregação a um momento de reconsagração. Um pequeno grupo sentiu-se tocado. Junto com eles veio o Dr. Justino.
 
Todos se ajoelharam e oraram. Ao final abraços e a despedida.
 
No sábado seguinte o Dr. Justino pregou no canal local da televisão. Antes da mensagem ele recordou a experiência que tivera. Disse:
 
"Caros amigos, no último domingo ouvi um príncipe do púlpito, o Pr. Porfírio, da igreja do bairro oeste. Sua palavra foi tão bíblica, tão doce, tão edificante, que o meu coração foi tocado pelo poder do Espírito Santo. Quero reprisá-la para vocês e espero que Deus multiplique em seus corações o que fez no meu ao ouvi-la dos lábios daquele santo homem do Senhor..."
 
O velho pastor, em lágrimas, ajoelhou-se ao lado da televisão com grande emoção, dizendo:
 
- Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao Teu Nome damos glória! Por amor da Tua misericórdia e da Tua fidelidade! Que o Espírito Santo aplique o texto bíblico aos corações.
 
Muitos frutos foram colhidos naquela transmissão. Tudo porque um pastor simples, pequenino, limitado, de um bairro tão inexpressivo, ousou ser fiel Àquele que o vocacionou para a pregação.
 
Que os meus leitores valorizem os seus pastores locais, que orem por eles que que propaguem as mensagens que o Senhor porventura lhes der. Que seja para a glória de Cristo e a edificação de Seu povo. Amém.
 

Wagner Antonio de Araújo

Nenhum comentário:

Postar um comentário

memórias literárias - 1477 - CHORA, Ó RAQUEL...

  CHORA, Ó RAQUEL...   1477   Quando o Senhor Jesus Cristo fez-Se homem, nascendo do ventre de Maria, Herodes o Grande desejou matá-Lo...