quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

memórias literárias - 847 - DIAS NUBLADOS

DIAS
NUBLADOS
 
847
 
Um ou dois dias nublados, cheios de nuvens cinzas e vento fresco até são interessantes, causam alívio do calor. Mas quando isso se torna longo, quando os dias amanhecem cinzentos por um longo tempo, com um friozinho não natural e a constante chuva e garoa, então a melancolia invade e o mal estar domina. Não fomos feitos para a neblina.
 
Dias nublados acontecem. Às vezes até no alto verão, como hoje, em São Paulo. Em uma época de termômetros altíssimos, é estranho sentir frio e ter que usar blusa. Não é natural olhar para o céu e não contemplar as nuvens brancas e o sol em seu fulgor.
 
Dias nublados também ocorrem na vida. Depois de um longo período de atividades, com inúmeros afazeres e desafios, o céu se torna cinza e o ânimo se esfria diante dos inúmeros combates. Descobrimos uma doença degenerativa, recebemos o aviso prévio e a demissão do trabalho, tivemos o cartão de crédito cancelado, os relacionamentos afetivos estão por um fio, o nosso ministério terminou. O céu torna-se cinza e não há expectativa de melhora.
 
O pior de tudo é quando o cinzento não vem do céu das nuvens, mas da nossa relação com Deus. Não vem do "sky", mas do "Heaven" (céu azul e o céu de Deus, em inglês). Quando a nossa comunhão com o Senhor foi turbada, foi rompida, foi prejudicada por causa de um pecado que praticamos, de uma injustiça da qual participamos, de uma responsabilidade que não assumimos, encontramos o céu de bronze e a presença de Deus distante como nunca. Parece que as orações não têm vida, não há força em nós, não sentimos paz.
 
Eu me lembro de um vôo que fiz há muito tempo, rumo a Vitória do Espírito Santo. O céu estava turvo, chuvoso, friorento. O aeroporto estava molhado, frio; as pessoas estavam encapotadas, cheias de blusas e cachecóis. Então entramos no avião e decolamos. O bólido subiu e rompeu as nuvens cinzentas, não sem trepidar e tremer. Penetrou no mais profundo turbilhão acinzentado e despontou do outro lado, acima, descortinando um céu azul belíssimo e o brilho do sol aquecedor e primitivo. Na verdade o dia não estava diferente dos outros, não fosse pela grossa camada de nuvens. Com o avião chegamos ao dia original lá no alto. 
 
Às vezes precisamos de um avião rompedor, que esburaque o nosso céu cinzento e atinja as camadas superiores da felicidade perdida, da alegria abandonada, das razões motivadoras e, quiçá da presença augusta do Senhor nosso Deus. Sem um veículo não poderemos transpor a barreira. E qual veículo é eficaz? Um veículo movido a três propulsores.
 
O primeiro: a fé. Ora, sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos que o buscam. (Hb 11:6). É preciso romper a incredulidade com o bólido da fé. Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem. (Hb 11:1). A fé é o jato que nos leva às alturas. E Jesus disse-lhe: Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê. (Mc 9:23)
 
O segundo: a esperança. Agora, pois, Senhor, que espero eu? A minha esperança está em ti. (Sl 39:7). Ainda que não haja muito o que esperar, o Senhor é a nossa esperança e Ele pode trazer uma motivação grandiosa, mesmo em tempos de enfermidade, de longevidade, de solidão.  Ó minha alma, espera somente em Deus, porque dele vem a minha esperança. (Sl 62:5). Voltai à fortaleza, ó presos de esperança; também hoje vos anuncio que vos restaurarei em dobro. (Zc 9:12). Ainda que esteja a morrer o crente tem esperança. Aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Salvador Jesus Cristo; (Tt 2:13).
 
O terceiro: o amor. Sim, viver sem amor é viver sem viver. O amor faz resplandecer os olhos do moribundo, recobrar o juízo e recuperar a saúde perdida. Mas, sobretudo, tende ardente amor uns para com os outros; porque o amor cobrirá a multidão de pecados. (1Pe 4:8). O amor gera vida. Conservai-vos a vós mesmos no amor de Deus, esperando a misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo para a vida eterna. (Jd 1:21). O amor é capaz de doar-se a si mesmo e com isso se alegra. Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos. (Jo 15:13)
 
Os dias nublados acabam. Se não em vida, na eternidade. Pois lá não haverá mais nada a turbar a nossa visão. Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido. (1Co 13:12).
 
O sol há de brilhar amanhã, estejamos certos disso.
 

Wagner Antonio de Araújo

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