domingo, 31 de março de 2019

memórias literárias - PÁGINAS SOLTAS - 781 - MAIS ALTO!

MAIS ALTO!
 
 
781
 
"Bom dia, Igreja!" - "Bom dia!", responde o auditório. Salão repleto, gente animada, povo feliz.
 
"Que bom estarmos juntos novamente louvando e engrandecendo ao Senhor! Vamos manifestar o nosso amor por Ele, cantando com ânimo e fé! Abrace ao seu irmão e lhe diga: eu te amo, meu irmão!" Então o povo se abraçou, se cumprimentou, enquanto os instrumentos musicais começavam um ritmado cântico de adoração.
 
"Vamos lá, igreja! Vamos louvar ao Senhor!" E começaram a cantoria. A letra era exibida no datashow e as palmas permeavam o acompanhamento público. Mas, subitamente, no meio do auditório, um homem gritava:
 
"Vamos, regente! Cante mais alto, mais alto!"
 
No início ninguém o considerou. Mas a cada canção o homem insistia, de pé e a caminhar pelo corredor. O regente dizia:
 
"Irmãos, vamos cantar a canção de amor pelos irmãos, vamos falar o quanto todos são importantes para nós, vamos declarar a aliança que temos no Senhor!"
 
"Mas falem mais alto, mais alto! Está muito baixo! Não estou escutando direito!"
 
O regente e o grupo de músicos, incomodados com a situação, interviram:
 
"Meu senhor, por favor, queira dar licença e não interrompa mais a nossa adoração. Estamos na Casa do Senhor e as suas palavras estão perturbando. Poderia, por favor, respeitosamente, não mais perturbar?"
 
"Não sou eu quem perturbo, regente. Eu só não estou ouvindo o suficiente. Eu me calarei, mas antes me diga: considerou de fato o que cantou?"
 
"Aqui todos consideramos o que cantamos, senhor. Por favor não nos perturbe novamente!"
 
"Eu não perturbo. A hipocrisia deste culto é que perturba a Deus. Regente, durante toda a semana cinco irmãos lhe procuraram para orar e receberam a mesma resposta: marque uma entrevista. É mentira? O povo se congraça na hora do cântico, mas passa a o mês inteiro sem dar a menor atenção para o irmão que canta ao seu lado. Não é mesmo, José? " E virou-se para um lado do auditório, onde um José estava sentado. Este, tentando esconder-se, fez sinal de não saber do que se tratava.
 
"Sim, José. Você insultou a sua mãe ontem, quando esta lhe dava conselhos, gritou com ela e deixou-a no centro da cidade sem condução, exigindo respeito à sua liberdade. Você não respeitou a sua mãe. Que amor é esse que agora você canta, José?" O rapaz não sabia onde colocar a cara. Sua mãe, perplexa, diz ao José: "Eu não disse nada a ninguém, meu filho!". O pastor, já nervoso e enfurecido, ao verificar o tumulto, chamou dois diáconos para tomarem o rapaz pelo braço. O homem virou-se para os diáconos que chegavam e disse-lhes: "Um instante, homens. Estão com as mãos limpas?"
 
Os diáconos, nervosos, não conseguiam dar o próximo passo. Então ouviram:
 
"Eu perguntei se estão com as mãos limpas! Sim, vão usá-las para colocarem-me para fora. São as mesmas mãos que consultaram pornografia no celular durante a madrugada? Ou são as mãos que afanaram ferramentas da oficina mecânica onde trabalham? Estão ou não com as mãos limpas?" Agora todos estavam desconfortáveis e o vozerio era de repulsa.
 
O pastor, enraivecido, levanta-se e se dirige ao homem, desejando arrastá-lo para fora. "CIDADÃO, VOU CHAMAR A POLÍCIA PARA LEVÁ-LO PRESO. ESTÁ A PERTURBAR UM CULTO PÚBLICO!" O homem então diz: "Estou perturbando a igreja, pastor? Seria eu o hipócrita deste salão?  A força que impulsiona as suas pernas a vir ao meu encontro poderia ter sido usada para fazer aquelas visitas que o senhor prometeu aos idosos da igreja e nunca cumpriu, não é mesmo? Não é, irmã Isabel, irmã Maria e irmã Myrthes?" Duas estavam presentes. "Antes de me arrastar para fora teria sido melhor não ter erguido a sua mão para bater na sua esposa na terça-feira. Lembra-se? Também teria sido melhor não xingar aqueles palavrões diante de seu filho, a quem tem ensinado a não usar palavras chulas. Faça o que eu digo e não o que eu faço, não é mesmo, ministro? A quem o pastor está servindo? A Deus ou à sua carteira? Joelhos que não se dobram em oração e pés que não levam as boas-novas agora querem correr contra mim?"
 
"CALE A BOCA E RETIRE-SE!", gritou o pastor, correndo até ele. O homem, erguendo a mão, ordena: "PARE". O pastor emudece, estaca onde pisou e petrifica-se, perplexo. O homem então diz: "Todos em seus lugares. Sairei em breve." Ninguém conseguia falar ou mexer-se. Ele dirigiu-se à plataforma, olhou para todos e disse:
 
"Povo que se diz de Cristo, vocês são os reis da hipocrisia! Têm bíblias mas não as lêem; dizem que amam uns aos outros mas não se preocupam com ninguém; afirmam amar a Deus, mas renegam-no com uma vida pagã, pior do que a dos incrédulos! Povo hipócrita, a foice do Senhor irá cortá-los! Vocês se acham ricos, sábios, cultos, cheios de graduação, dominadores das mídias, famosos, antenados, modernos e atraentes. Mas vocês não passam de miseráveis, pobres, cegos e nus. São miseráveis da graça de Deus, pois estribam-se em si próprios e não se arrependem de sua arrogância. Querem que Deus seja um serviçal de vocês. São cegos, pois não enxergam onde caíram, onde sucumbiram, onde deixaram o primeiro amor, onde traíram ao Senhor Jesus Cristo. Estão nus, pois, ainda que sejam complexos e cheios de tecnologia, os seus pecados e rebeldia estão patentes e aparentes em seus olhares hipócritas e maliciosos, em sua arrogância cultual, em sua sensação ridícula de felicidade desprovida da Verdade. Há muitos pecadores que não têm onde congregarem, porque vocês fecharam a porta do céu! Eles procuram uma igreja e acham um clube; procuram crentes e encontram hipócritas; querem bíblia e vocês dão opiniões; desejam louvar e vocês dão espetáculo! Igreja apóstata, o Senhor tem contas a acertar com vocês!"
 
Em seguida dirigiu-se aos músicos dizendo-lhes:
 
"O louvor que agrada a Deus é um coração quebrantado e contrito, uma alma submissa, um comportamento de quem vive o amor, não de quem apenas declama ou canta o amor. Parem com hipocrisias! Parem de copiar o mundo! O show tem que acabar! Não usem da música para projetarem-se como artistas. Adoradores atores são hipócritas. Lamentem, chorem os seus pecados, lancem os seus deuses fora e olhem para Aquele que os chamou das trevas para a Sua maravilhosa luz. Então poderão cantar baixinho, mas serão ouvidos. Cantem para louvar a Deus e para evangelizar aos homens, não para fazerem sucesso ou narrarem sensações. Então Deus não mais os vomitará culto após culto. Então os céus se abrirão para a música de vocês. Então faremos um contracanto com os seus hinos..." Quando ele disse "faremos", como se não fosse um homem, seu rosto, roupas, sapatos e sua face começaram a brilhar com uma luz fora do comum. O povo caiu de joelhos, amedrontado, perplexo, arrepiado. Ele não era um homem. Ele era um anjo do Senhor.
 
Levitando levemente, com um brilho ofuscante, afirmou:
 
"O tempo está próximo. Arrependam-se e voltem-se ao primeiro amor. Voltem ao velho evangelho, às veredas antigas. Bebam do genuíno leite espiritual, evoquem os fundamentos da fé autêntica.  Se não o fizerem terão contas duras a acertar com o Senhor. EIS QUE EU LHES ADMOESTO. Vem, Senhor Jesus!"...
 
E o anjo desapareceu....
 
E eu acordei.
 
Wagner Antonio de Araújo
31/03/2019

 

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