sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

memórias literárias - 386 - A ESTÓRIA DE GOULART





A ESTÓRIA
DE GOULART
387
 
Goulart era um líder em sua igreja. Bom pregador, bom professor, estava em todas as diretorias de todos os anos. Exercia o papel de diretor. Se a igreja precisava de pintura, era Goulart que propunha. Se precisava de verba para um passeio, Goulart centralizava a realização. Quando um desafio surgia, todos diziam: "Vamos falar com o Goulart". E assim as coisas aconteciam.
 
Ele também era responsável por dirigir a igreja quando esta ficava sem pastor. Era o vice-presidente. Também ocupava a direção da comissão de finanças. Ia atrás de obreiros e conseguia trazer dois ou três do agrado da igreja. Após a assembléia, sempre emplacava aquele que era de sua preferência. A igreja festejava. E ele figurava como o melhor amigo do pastor.
 
Mas era ele também que cuidava de tirá-lo quando não o agradava. Geralmente com seis meses ou um ano o Goulart iniciava o seu embate com o novo obreiro. Nas assembléias fazia questão de dar o seu voto contrário ou contrapor-se às iniciativas do pastor. Como detinha a comissão de finanças, impedia aumentos salariais ou propunha diminuição nas prebendas. Ele conseguia deixar o obreiro em situação pública desconfortável. Após as manhãs dominicais de assembléia, chegava em casa com esposa e três filhos, festejando os embaraços.
 
- É isso aí, pastor aqui tem que comer na minha mão!
 
Nessas ocasiões a mesa do almoço era palco dos mais grotescos comentários sobre a igreja e sobre o obreiro. Geralmente convidava famílias proeminentes para almoçar. Os casais à mesa, junto com os filhos, ouviam as conversas:
 
- Essa igreja não é nada sem a minha ajuda! Quem esse pastor pensa que é? Vamos tirá-lo. Podem ficar sossegados! Mais duas escorregadas dele e conseguiremos propor a sua saída.
 
Os filhos a tudo assistiam. O pai, sempre ativo e elegante na igreja, não era assim dentro de casa. Xingava a esposa e assistia ao futebol com latas de cerveja e lingua chula nos comentários. Os filhos vibravam. Construíam o seu conceito de fé e de igreja do jeito que o pai ditava: uma farsa, uma fachada, uma aparência.
 
A esposa não era santa. Ainda que humilhada pelo marido, também tinha uma língua ferina e cuidava para que as mulheres estivessem coesas nas brigas eclesiásticas. Quando o pastor renunciava era ela quem coordenava a churrascada da vitória, sempre cheia de jocosos comentários contra os obreiros.
 
O tempo passou e os meninos cresceram. Goulart, detentor de um bom emprego na área contábil da empresa, foi demitido por justa causa nas suspeitas comprovadas de desvio de recursos. O assunto nunca foi abordado na igreja, pois como exercia a vice-presidência e as notícias eram abafadas em casa, quase ninguém soube do motivo. Os resultados da demissão chegaram. Os 4 imóveis que possuíam deram lugar a um só. Goulart resolveu investir em vendas; acabou sucumbindo. Por fim tornou-se vendedor de queijos de Minas Gerais, que conseguia lá no mercado municipal. 
 
E os meninos? Eles cresceram. O mais velho tornou-se satanista. Com tatuagens até nas pálpebras e piercings em toda parte, criou um site onde zombava da fé cristã e da hipocrisia dos homens. Casou-se com uma lésbica e tem dois filhos drogados. Ultimamente tem se mostrado depressivo e tentou o suicídio.
 
O segundo filho tornou-se homossexual. Foi viver na Alemanha, onde morreu de AIDS.
 
O terceiro cuida do Goulart e da esposa. Sim, porque o casal, antes tão cheio de autoritarismo e de poder financeiro, envelheceu. Goulart ganha uma mísera aposentadoria e a esposa gasta tudo com remédios. Então o caçula, casado recentemente, cuida deles. Goulart só vai à igreja quando o filho resolve levar. Aliás, o rapaz nem quer ouvir falar em cristianismo. Ele diz que foi a desgraça de sua casa. Goulart chora. Sente saudades do tempo em que cantava os hinos e que ouvia os sermões. Hoje vive a trocar bobagens no whatsapp e a lamentar o péssimo cristão que foi.
 
Trágico fim de um crente que construiu a sua casa sobre a sua própria arrogância.
 
Obs: esta ESTÓRIA é baseada em fatos muito reais.
 
Wagner Antonio de Araújo
16/12/2016

 

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