quinta-feira, 23 de março de 2017

memórias literárias - 426 - PAULO, PAULO, SEJA TOLERANTE!

PAULO, PAULO,
SEJA TOLERANTE!

426
"Prezado Apóstolo Paulo:

Ref. Práticas de Intolerância em Seu Ministério

Caríssimo companheiro de jugo

Kharis Eyrene! *

Encaminhamos esta carta com os votos de que esteja feliz e no centro da vontade de Deus.

Contudo, analisando o conteúdo das epístolas que tem escrito às igrejas dos gentios, precisamos tecer algumas observações e solicitar algumas providências.

Consta que o irmão vem ensinando e propagando algumas coisas que, ao nosso ver, são incompatíveis com a mensagem do evangelho.

O irmão solicitou que as irmãs de Corinto usassem véu e que tivessem cabelos longos.

O irmão sugeriu e interpôs-se como modelo para recomendar que homens e mulheres não se casassem.

O irmão ordenou que os judeus abandonassem suas vestes cerimoniais e os ritos judaicos, adotando, inclusive, a inobservância da circuncisão de seus filhos.

Também falou que o amor conjugal entre pessoas do mesmo sexo era condenado por Deus e inadmissível na igreja.

O irmão ordenou que não se comesse carne dos açougues dos templos pagãos e afirmou que participar daquilo seria banquetear-se com demônios.

Finalmente, tomou decisões unilaterais de disciplina eclesiástica, condenando um homem que ajuntou-se com a madrasta (ou mãe, não se sabe ao certo), dizendo que ele seria entregue a Satanás.

Apóstolo Paulo, o irmão deveria envergonhar-se de ser tão intolerante. Afinal, Cristo nos ensinou a amar e a acolher a todos. Como nenhum de nós é Cristo, então não é possível exigir uma imitação de Cristo por parte de ninguém. Logo, cada um tem suas próprias características e opiniões e devemos respeitá-las, tolerando os irmãos diferentes.

Gostaríamos que o irmão reescrevesse seus textos, fazendo as seguintes modificações:

1) Que as mulheres cortem os cabelos ou os mantenham compridos do jeito que quiserem, e que o uso do véu seja uma opção pessoal;

2) Que os homens se casem ou se ajuntem à vontade, independentemente de serem homens com homens ou mulheres com mulheres, e que desfrutem de todo o amor conjugal uns com os outros;

3) Que os judeus observem o que quiserem dos ritos mosaicos e das suas festividades nacionais; e não só eles, mas que cada um dos gentios traga para a igreja os seus próprios costumes, rituais, manifestações musicais e atos de culto, no enriquecimento mútuo e na edificação da fé cristã;

4) Que os crentes comprem toda a carne que quiserem, comam o que quiserem e participem de todas as festividades pagãs que quiserem, independentemente de serem dedicadas a ídolos, pois estes são apenas tipos e arquétipos sem valor; Deus não olha para isso;

5) Que o irmão parasse de falar em demônio, reino do mal, obras da carne, que só traz sentimento de culpa e dedo acusatório às congregações.

6) Finalmente, que o irmão autorize o rapaz que ajuntou-se com a mãe ou madrasta a viver a vida comum do lar, fazendo dela uma esposa feliz.

Com zelo pela Obra,
Concílio de Laodicéia"

............

Como diriam os gaúchos, "barbaridade, tchê"! Já imaginaram um absurdo destes?

Pois é. Isto não aconteceu. Pelo menos não ali. Está acontecendo aqui, agora, no meio do mundo chamado cristão.
E como começou?

Em 323 A.D. Constantino, imperador de Roma, oficializou o cristianismo como a religião oficial do Estado. Como a porta de ingresso não foi a conversão, admitiu-se que cada um trouxesse debaixo do braço o seu próprio deus, a sua própria cultura, os seus próprios costumes, as suas próprias feitiçarias, a sua própria moralidade. Juntou-se tudo e formou-se uma colcha intragável de paganismo. Ao longo da história desta igreja inúmeros clérigos buscaram a vida monástica, os mosteiros, as grutas, para fugir da orgia religiosa deste cristianismo forçado. Em séculos a massa heterogênea transformou-se num bolo homogêneo de doutrinas, de dogmas, de crendices, de tradições e de regras. Pouco do cristianismo original ficou.

Um milênio e muitos séculos depois, na década de 60 do século XX, o Papa Paulo VI convocou um concílio da Igreja Católica Apostólica Romana. Deste concílio participaram as autoridades eclesiásticas chamadas de Sagrado Magistério (Papa, Cardeais, Bispos). Durante muito tempo discutiram as doutrinas e práticas cultuais católicas e chegaram a um consenso: o catolicismo deveria abrir-se às outras expressões religiosas, principalmente às chamadas cristãs sectárias (protestantes e pentecostais), acolhendo a fé diferente, ainda que considerando a católica romana única representante da verdade completa.

Lefèvre, um bispo francês, opôs-se e iniciou um levante, um cisma no catolicismo. Sua tese era a seguinte: "Se eu, como bispo católico, creio que a minha fé é a verdade, como posso aceitar que outra fé, diferente da minha, também seja verdade? Se ambas são verdadeiras (e discrepantes), ambas são falsas, porque se anulam. Logo, aceitar que o catolicismo abra mão de suas tradições e fé em prol de outras maneiras de crer é negar a própria fé. Queremos continuar católicos e não admitimos a relatividade da verdade, que é unica." Esse bispo foi uma pedra no sapato de Roma. E o é até hoje, anos depois de sua morte. Bento XVI  o reconciliou pós-morte, mas o atual Papa, Francisco, é o absoluto antagonismo de Lefèvre.

Essa onda de abrir mão da fé para tolerar a fé alheia inundou o meio evangélico também. Antes, com modelos teológicos e eclesiológicos claros, o mundo protestante e evangélico tinha um modelo, um ideal e um limite; as pessoas aderiam buscando adequação a esta fé e a este modelo. Começando com os luteranos e atravessando o presbiterianismo e o metodismo, a onda chegou aos batistas e pentecostais. Hoje é muito difícil distinguir quem é quem, pois o caldo é tão denso e são tantas as misturas, que perdeu-se, inclusive, o motivo de se aderir à fé evangélica (ela tornou-se igual a qualquer coisa, inclusive a nenhuma fé).

Em minha denominação, a batista, a onda começou na outra América. Atravessou a Europa e, finalmente, arrebentou no Brasil. Uma tsunami de mudanças, de alterações, de agir no "politicamente correto". Hoje isso tem outro nome: "INCLUSÃO", "DIÁLOGO" e "TOLERÂNCIA".

A carta fictícia lá em cima teria o seguinte teor nos dias de hoje:
1) A igreja deve ser inclusiva, recebendo pessoas em qualquer estado civil; não há necessidade de mudar nada.

2) A igreja deve aceitar a opção sexual de cada indivíduo e família, buscando incluí-los na normalidade do serviço e da comunhão.

3) A igreja deve aceitar toda manifestação cultural como boa e possível na eclesiologia; logo, podemos usar os ritmos africanos das religiões ocultistas, o rock americano e europeu, as músicas das tribos indígenas, a música contemporânea, o funk de favela, qualquer uma, pois nenhuma é boa ou ruim em si; manifestam-se apenas como expressões de uma cultura.

4) A igreja deve ser totalmente democrática, optando pela forma de cultuar, de servir, de decidir as suas questões, independente de qualquer regra pré-estabelecida, pois isso seria uma intolerância e ditadura do poder religioso.Nem a Bíblia pode servir de regra, uma vez que era a expressão de uma época antiga e primitiva.

5) A igreja não é dona da verdade, ninguém o é; portanto, a verdade deve ser relativizada, buscando um consenso e uma tolerância entre as opiniões divergentes. Qualquer verdade é verdade se crida e abraçada.

6) A juventude pode se tatuar, usar piercings, drogas, bebidas, participar de festas e de vida sexual ativa, desde que respeite ao próximo e mostre bondade em tudo o que fizer.

7) O pastor deve ser, acima de tudo, um agente do diálogo, nunca repressor, jamais intolerante; deve buscar na contemporaneidade a resposta às questões de vida da comunidade, tornando-se referência de boas escolhas.

Poderíamos estender a lista à infinitude. Estes ítens nos bastam.

Isto prova uma coisa: perdemos um MODELO, UM ALVO, UM PADRÃO. Antes o padrão era Cristo e o "assim diz o Senhor". Hoje abandonamos o padrão e consideramos tudo como "opinião pessoal". Isso é bem explorado no filme "A JORNADA", de Rich Christiano. "O pecado se tornou lentamente aceitável para nós porque nós o vemos o tempo todo e não nos choca mais. Satanás é mais esperto do que pensamos. À medida em que as pessoas se tornavam mais liberadas, parecia haver cada vez menos convicção. Porque não havia absolutamente qualquer autoridade; por isso as pessoas podem blasfemar contra o nome do Senhor e não pensam nisso." Antes se dizia: "não roube porque Deus diz que é pecado". Hoje se diz: "não roube porque é pecado"; então alguém afirma: "esta é a sua opinião; a minha é outra". Na primeira havia uma autoridade, um alvo, um padrão, um Deus de autoridade. Hoje não há mais fé, não há mais padrão, não há mais uma uma voz de autoridade. E por que? PORQUE DEIXAMOS DE SER CRENTES. Somos qualquer coisa, mas não somos crentes. Parafraseando Lefrève, se o que eu creio como verdade na Bíblia não me é mais absoluto, então não há verdade e não há sentido na fé.
Mas, bendito seja Deus, nem todos foram atingidos por essa "TOLERÂNCIA", esse "DIALOGAR", essa "INCLUSÃO" generalizada.

Assim,

1) Igreja não é O SEU LUGAR, mas o lugar de quem está ligado a Cristo, por arrependimento e fé, através da regeneração pela conversão.

2) O corpo não é papel para ser rabiscado com tintas, vestido como palhaço ou furado como uma borracha; o corpo é templo do Espírito Santo.

3) O sexo não é mero meio de prazer, mas instrumento de perpetuação da espécie; meio de estabelecer o padrão divino na criação da família e célula principal na formação de uma sociedade cristã.

4) Homens com homens e mulheres com mulheres não são opções que Cristo, em Sua Palavra, tenha tolerado, permitido ou desejado; homem e mulher no princípio, no meio e no fim SEMPRE foi o ato criador de Deus; o que passa disso é de procedência maligna.

5) O Paulo que considerou toda a sua herança judaica como refugo por causa da sublimidade de Cristo, tem a mesma postura de uma igreja bíblica onde os costumes gentílicos e os pecados pagãos são banidos; logo, não há espaço num meio cristão legítimo para a admissão de bailes, de festas religiosas pagãs, de fazer do esporte um ídolo ou de transformar a liturgia do culto numa colcha cultural de retalhos étnicos. Também não há espaço para judaizar a igreja, transformando-a numa sinagoga, observadora de luas novas, de sábados, de festas nacionais de Israel ou de meros braços daquela nação. Somos da Nova Aliança no sangue de Cristo, que derrubou as muralhas e de ambos os povos (judeus e gentios) fez um!

6) A igreja verdadeira não admite outras verdades; para ela, Cristo é a verdade e a Bíblia é a regra de fé e prática, não sujeita às correntes e vertentes culturais da contemporaneidade sociológica; seus valores são milenares e não são reconciliáveis com o padrão comportamental de qualquer tempo. Está no mundo, mas não milita com ele em sua forma de pensar, agir ou conviver; sua proposta é muito, muito mais elevada.

7) Num mundo verdadeiramente cristão os homens são convertidos e são TRANSFORMADOS em novas criaturas, não recebidos com os seus múltiplos pecados e tolerados como jóias;

8) A igreja do Senhor não é uma costura de muitos membros de corpos diferentes, como um Frankestein sem alma; ela é padronizada pelo Senhor Jesus, onde cada crente é instado dia e noite a ser como o Seu Senhor, a andar como Cristo andou, a padronizar comportamento e fé à Palavra de Deus; e isto é obra do Espírito Santo no coração convertido, não a força de um condicionamento cultural ou massificação psicológica ou doutrinamento político.

Finalizando.

(E sei que Paulo não me ouve; é apenas força de expressão):

Paulo, Paulo, graças a Deus você foi quem foi! Temos orgulho de você!

Bendito seja Deus por sua vida de fidelidade ao Senhor, à Sua Palavra e à verdadeira fé.

Que nos inspiremos em você e em todos os outros apóstolos, colocando no topo o nosso Senhor Jesus Cristo, para não nos tornarmos mortos e falsos como a maioria dos crentes contemporâneos.

Seja Deus engrandecido.

Pastor Wagner Antonio de Araújo

* Graça e paz.

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