quarta-feira, 21 de março de 2018

memórias literárias - 637 - SAIR DO PESADELO

SAIR DO
PESADELO

637
 
 
Desde pequeno eu sofro com pesadelos, caso venha a dormir de barriga para cima. Posso dormir em qualquer posição, menos nessa. O interessante é que eu percebo quando o pesadelo chega. Ele vem sorrateiro, devagarinho. Há um leve sono que domina, manso, muito tranquilizante. E, de repente, sem que se perceba, é como se eu caísse num precipício: os braços e as pernas perdem os movimentos e eu, que não desejo ter pesadelo, sinto-me aprisionado. Quero abrir os olhos e não consigo. Quero falar algo, sair desta posição, mas sinto-me refém e dominado. Às vezes me desespero. E foi muito cedo que descobri uma forma de me livrar do pesadelo. Nem sempre ela funciona, mas, na maioria das vezes sim. Conquanto nesse estado eu tenha perdido o domínio dos braços e das mãos, sempre sobra um pouquinho. Então, com muito esforço, tento arrastar a mão pela barriga rumo ao rosto. O braço pesa uma tonelada, mas eu tenho que tentar, e com rapidez, pois o pesadelo está chegando. Vou arrastando a mão, subindo, subindo, até atingir o rosto. Então faço os dedos caminharem com sofreguidão, passo a passo, pelo rosto. Ele passa pela boca, pelo nariz, até atingir um dos olhos. E, em lá chegando, eu junto dois dedos e abro uma pálpebra. Vitória! Consegui sair daquele sofrimento!  Eu poderia mexer na boca, no nariz, isso de nada adiantaria. Mas quando abro os olhos, saio da prisão.
 
A Bíblia também nos fala de uma prisão, a da frieza espiritual. Há muitos cristãos que não conseguem orar. Eles até tentam, insistem, mas parece um pesadelo, aprisionando-os nas preliminares da prece. Começam bem: "Senhor Deus, eu Te agradeço por mais este dia..."  e geralmente não vão muito longe. Planejaram orar bastante, mas não conseguiram vigiar nem três minutos! Eles se perdem nas palavras, mudam os pensamentos, decidem consultar o celular, abrir a janela, fazer qualquer coisa. E pensam: "Depois eu continuo..." E o depois nunca chega. O Espírito Santo, que habita no coração do crente, entristece-se e traz ao coração do discípulo uma insatisfação profunda. Frustrado, pensa: "Por que eu não consigo fazer uma oração completa, vitoriosa, verdadeira, que tenha começo, meio e fim, da qual eu me alegre e me sinta verdadeiramente em comunhão?"
 
O motivo é que há dois inimigos que nos aprisionam a uma vida de pobreza espiritual. O primeiro está dentro de nós. Ele se chama CARNE. É a nossa natureza adâmica, que milita contra a nova natureza espiritual. Ela não tem prazer na busca do Senhor; pelo contrário, ela está entorpecida em seus próprios pecados. Basta abrir a Bíblia para ler, ou dobrar os joelhos para orar que a manifestação da carne é certeira: um sono inconveniente, um cansaço, uma indisposição profunda aparecem. Tais sintomas inexistem se ligarmos o celular, assistirmos a vídeos ou buscarmos outras atividades. Mas para orar ou para ler a Bíblia, ah, é um convite à indisposição. Isto vem da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis. (Gl 5:17)
 
O segundo inimigo vem de fora. É Satanás, o inimigo, com os seus demônios. Eles nos odeiam e odeiam a Deus. Eles estão condenados, mas não querem ir sozinhos para o Lago de Fogo. Eles querem levar a todos os homens com eles. Quanto aos salvos, aos que conhecem a Jesus, eles desejam evitar que tenham comunhão, desejam que sejam infrutíferos e relapsos. Assim eles criam fantasias e tentam os homens. Na hora da oração surgem inúmeras idéias de coisas para fazer: lembramo-nos de uma tarefa inacabada, pensamos em pessoas diversas, entramos em conflito com questões políticas, nos aborrecemos, ouvimos ruídos que não estavam audíveis antes da oração. Enfim, somos de tal forma incomodados que sucumbimos e deixamos de orar. Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar; (1Pe 5:8)
 
Quem sente tudo isso na hora da oração está envolvido no pesadelo espiritual: quer orar, mas não consegue. Tenta, mas é incapaz de mobilidade; está amarrado à inércia de um sono avassalador, sono da alma, que não consegue um diálogo criativo com o Criador. Suas orações não passam de recortes malfeitos de frases incompletas. Sentem-se aborrecidos e querem sair desse marasmo. Mas como?
 
Do mesmo jeito em que eu consigo sair dos pesadelos: ABRINDO OS OLHOS! Desvenda os meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei. (Sl 119:18); Por isso diz: Desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos, e Cristo te esclarecerá. (Ef 5:14). Jesus, quando selecionou três apóstolos para vigiarem com Ele, achou-os dormindo, de olhos fechados. E disse: E, chegando, achou-os dormindo; e disse a Pedro: Simão, dormes? não podes vigiar uma hora? (Mc 14:37)
 
E como se faz isso? Da mesma forma com que consigo acordar: forçando o braço, a mão e indo até o olho para abrir uma pálpebra. Depois de aberta, a libertação vem. Assim é também na vida de quem quer vencer na oração, ter vitória nos clamores: deve ousar e avançar. Se orar em pensamento causa divagação, ore audivelmente. Se orar de joelhos causa sono, ore andando. Se orar num ambiente fechado causa descanso demasiado, ore na rua. Mas INSISTA ATÉ SAIR. Eu já aprendi que, quando estou frio em minha devoção e em minhas orações, devo insistir, insistir e não acabar um encontro com Deus de qualquer jeito, mas cumprir o roteiro que havia planejado. Se me dispus a orar pela família, hei de apresentar um por um. Se pela igreja, citarei cada irmão. Se pelo país, trarei à mente os problemas que conheço. Se de joelhos sentir sono orarei de pé. Se parado sentir-me tentado a pensar em outras coisas, orarei andando pelo quintal. E há algo que acontece quando me disponho e insisto: o sono se vai, as amarras da frieza se vão e Deus acende uma fornalha de ânimo na alma, trazendo prazer imenso em buscá-Lo em oração.
 
Experimente. Não fique no pesadelo. Leve o dedo ao olho e abra a pálpebra. Você conseguirá.
 
Wagner Antonio de Araújo

21/03/2018

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