quarta-feira, 28 de março de 2018

memórias literárias - 641 - O CRENTE "BÍBLIA GASTA"

O CRENTE
"BÍBLIA GASTA"
 
                
 
 
641
 
Elaine, Rutinha e eu tentávamos hoje chegar até a igreja onde sirvo ao Senhor atualmente (Igreja Batista Boas Novas do Rodoanel em Carapicuíba, SP, Brasil) e não pudemos. O trânsito estava impossível. Só rodamos por alguns quarteirões e regressamos para a garagem. Fui ao bagageiro pegar a minha bíblia e lá não estava; Elaine estava com ela ao colo e deu-ma. Então falei-lhe: "Pois é, querida, a minha Bíblia está bem gasta; parece que está cada vez melhor." E completei: "Assim também é o crente fiel: quanto mais gasto, mais experiente".
 
Assim é a vida cristã: quanto mais tempo de vida com Deus, maiores experiências ganhamos e maior sabedoria adquirimos.
 
No início, quando entregamos o coração para Jesus, tudo é novidade, tudo é lindo, tudo é novo. Igual as bíblias novas que adquirimos: beiras douradas ou vermelhas, capa novinha e sem sujeiras, páginas limpíssimas, sem um amasso sequer. Dá gosto olhar para ela. Quando somos crentes novos tudo é festa: enxergamos os crentes como pessoas sem problemas e sem manchas; a igreja é o melhor lugar do mundo; os hinos fazem o Céu descer à Terra e não há coisa mais bela do que a vida nova que recebemos do Pai.
 
O tempo passa e a bíblia vai sendo gasta (há quem não a leia e a mantenha intacta; ela fica nova, porém, inútil...). Começamos a romper as beiradas douradas, a abrir páginas outrora coladas, a fazer orelhas, a amassar pelo uso. Já não está tão nova, tão bonita quanto era; mas, por outro lado, como nos é útil! Assim também é o viver cristão. Aprendemos que os crentes têm problemas e muitos têm manchas. Aprendemos que a igreja nem sempre é o melhor lugar do mundo. Aprendemos que muita música cantada não corresponde à vida vivida e quem canta às vezes não vive. Mas nem por isso deixamos de valorizar a vida nova que o Pai nos deu.
 
Passa o tempo e a bíblia perde o brilho, perde o verniz, perde a beleza de um livro novo. Contudo, em suas páginas diversas, vamos escrevendo aquilo que Deus nos ensina. Marcamos textos, anotamos idéias, colocamos datas, grifamos, e, não raras vezes, sujamos inadvertidamente o livro, seja com uma xícara de café que vazou, seja com um pedaço de bolo que caiu na página, seja com a terra ou com a água do ambiente. A minha bíblia, por exemplo, chegou a encharcar-se quando fiz um aconselhamento debaixo de chuva.
 
Também a vida cristã é assim. O primeiro amor se vai. Aquele ânimo, o entusiasmo característico de quem nasce de novo perde-se com o passar do tempo.  Várias anotações, riscos e rabiscos são incluídos na história de nosso viver: experiências alegres de festas, momentos de luto e tristeza; aborrecimentos diversos que nos derrubam; soerguimentos maravilhosos em dias de depressão. Deus nos levanta e, junto com a restauração, dá-nos as marcas da experiência. Aprendemos a rir, a chorar, a enfrentar a tentação e a não errar nas mesmas coisas que erramos antes. As anotações feitas em nós permanecem para sempre, à luz da orientação bíblica e do Espírito Santo em nós.
 
Com o tempo compramos outras bíblias para comparação e estudo. Mas a nossa bíblia, aquela que nos acompanha dia após dia, essa torna-se mais do que especial. Ela tem a nossa cara, ela conhece as nossas preferências, ela nos serve de companheira, de bússola, de âncora, de ferramenta e arma. Eu tenho várias bíblias, até por força do ministério que exerço. Contudo, esta bíblia que uso tornou-se "a minha bíblia". Se eu vou a algum culto ou se vou ler devocionalmente, nenhuma outra serve; tem que ser a minha. Se não a tenho comigo até uso outra, mas sinto falta da minha companheira.
 
A nossa vida também ganha essa referência. As experiências que ganhamos com Deus tornam-se muito importantes. As experiências dos outros são bonitas, podem até ser mais ricas e mais complexas. Mas nada substitui a nossa comunhão verdadeira, do dia a dia, de um Deus a quem conhecemos, de um Deus que nos conhece, de uma vida aos pés do Salvador.
 
A bíblia nova é boa, mas a gasta é melhor. O início da vida cristã é maravilhoso, mas a continuidade dela, através da perseverança, é melhor ainda. Um crente gasto é um crente experiente, cuja vida vale a pena e cujas orações são encorajadoras. Ninguém fica jovem para sempre, nem mantém a bíblia nova sem defeitos, se a usar de verdade. Mas as suas palavras, escritas em tinta, com o tempo serão impressas na alma, escritas com o dedo de Deus no coração do crente. Ah, como é bom ser um crente gasto!
 
Tenho em minha biblioteca algumas bíblias assim. A minha primeira, a primeira de minha mãe e a primeira de meu pai; a do Pr. Timofei Diacov, a do Pr. Onofre Cisterna etc. Mas espero que a minha predileta fique para os meus filhos, se Jesus não voltar enquanto vivo. Esta bíblia está bem gasta e quero ser também um crente igualmente gasto, não estragado, mas experiente, cheio de vivência com o Senhor.
 
E você, leitor amigo, é crente "bíblia nova" ou é crente "bíblia gasta"?
 
Wagner Antonio de Araújo

28/03/2018

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