sábado, 29 de agosto de 2015

memórias literárias - 242 - 1o. PRÊMIO


 

1o. PRÊMIO

242
 
 
Petrônio era um jovem trabalhador. Era cristão e muito ambicioso. Queria ficar rico. Os estudos que tinha não eram qualificados e submetia-se a funções bastante modestas. Em conversas com o pastor sempre recebia conselhos para que agradecesse a Deus pelo que tinha e que buscasse estudar mais e aproveitar as oportunidades que lhe surgissem, desde que fossem lícitas.
 
Começou a trabalhar numa farmácia. E transformou-se em pouco tempo num querido e estimado atendente. Aplicava injeções, recomendava profilaxias, falava sobre medicamentos e buscava atender a todos da melhor maneira. O gerente o ensinou a comprar das distribuidoras, a buscar as melhores ofertas e a manter o estoque em dia. Petrônio era tido como o "médico da região", não por medicar indevidamente, mas por ter informações precisas e seguras e por atender bem a todos.
 
Certo dia o pastor precisou de um remédio e foi à pé à farmácia. Caminhando e pensando, aproximou-se da drogaria e viu ao longe o Petrônio rodeado de gente. Parecia que estava distribuindo alguma coisa. Chegou-se perto e ouviu: "Mané? O seu é o gato; Zé, o seu é a vaca; Aloísio, está aqui o tatu". O pastor, perplexo, percebera que o Petrônio estava vendendo papéis do "jogo do bicho" (uma contravenção brasileira muito popular nos grandes centros). Quando ele terminou de distribuir os papéis e viu o pastor, sua fisionomia mudou. Ficou branco e vermelho, e foi perguntando:
 
- Oi, pastor, como vai, tudo bem? Posso ajudar?
 
- Sim, Petrônio. Pode ajudar a si mesmo, explicando-me o que acabei de ver. Você está vendendo jogo do bicho?
 
- Ah, pastor, é só uma ajuda no orçamento, coisa pouca. Logo vou parar com isso e ficar só com a farmácia.
 
- Petrônio, lembre-se de que isso é contra a lei e que não é dessa forma que Deus nos ensina a ganhar o nosso pão!
 
- Pastor, os políticos são os primeiros a quebrar a lei; logo, não estou fazendo nada que as autoridades não saibam e não façam pior.
 
- Petrônio, você é crente! Você tem um testemunho para dar! Deus é o nosso sustentador e não deseja que você duvide de Sua graça! Não é necessário fazer serviço extra em algo que vicia, que leva um a ganhar e todos a perder, não é digno um cristão meter-se com a jogatina!
 
- Vou pensar nisso, pastor! Ore por mim! Obrigado!
 
Naquela semana o pastor orou muito e pensou no que faria. Afinal, Petrônio era um bom crente, mas infelizmente fora fisgado pela tentação das riquezas. Lembrou-se da Palavra de Deus, que dizia: Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. (1Tm 6:9); Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores. (1Tm 6:10)
 
No mês seguinte, no domingo pela manhã, quando o culto começava, Petrônio chegou com a família. Estava trajado diferente, com óculos escuros, deixara um carro enorme e caro no estacionamento, estava rodeado de irmãos que beijavam sua esposa e admiravam seu veículo. O pastor insistitu para que todos entrassem.
 
Findo o culto o tesoureiro veio falar com o pastor.
 
- Pois não, irmão. O que há?
 
- Pastor, acho que Deus atendeu às nossas necessidades! - Entregou-lhe um envelope à mão, contendo um cheque de um milhão de reais.
 
- O que é isto, irmão? Quem entregou?
 
- Foi o Petrônio.
 
- Chame-o, por favor.
 
Logo chegou o Petrônio, sorridente, alegre, com uma caixa de bombons finos para o pastor.
 
- E aí, pastorzão? Tudo certinho? Gostou do dízimo? Espero que esteja feliz!
 
- Explique-me o que é tudo isso, Petrônio. Onde arrumou esse dinheiro todo?
 
Então ele contou que numa noite da semana sobrou um bilhete do jogo do bicho e ele não teve tempo para devolver. E o número do bilhete ganhou uma grande soma, pois foi sorteado com valor acumulado. Ganhara dez milhões de reais. Sua primeira atitude fora a de agradecer a Deus e de entregar o dízimo.
 
- Pastor, estou cumprindo Mateus 6.33. Antes de gastar comigo, quero entregar aquilo que é de Deus!
 
Naquele momento muita coisa passou pelo coração do pastor. Um milhão de reais! "Ah, ministro do Senhor, chegou a hora de erguer aquela escola anexa com a qual você sempre sonhou! É tempo de comprar o terreno ao lado para expandir o templo e fazer classes de Escola Bíblica Dominical! O ônibus para buscar os crentes sem condução e a compra do terreno para a congregação! Deus atendeu às suas preces! Aleluia!" Sim, ele pensou nisso. Em seguida lembrou-se do texto da tentação de Jesus: E disse-lhe: Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares. (Mt 4:9). Percebera o quanto seria maravilhoso ter os recursos para a Obra de Deus e o quanto seria desastroso quebrar o ensino bíblico sobre como ganhar dinheiro e não ser escravizado pelos jogos de azar. A riqueza de procedência vã diminuirá, mas quem a ajunta com o próprio trabalho a aumentará. (Pv 13:11). Era uma contravenção e, como tal, pecado, mau testemunho. Não fora roubado, mas não era do jeito bíblico de se conseguir recursos.
 
Então calmamente falou para o sortudo Petrônio:
 
- Irmão, os bens que chegam fáceis, também se vão facilmente. Não é assim que Deus nos sustenta. Não aceitarei esse dízimo e lhe digo que não foi uma maneira boa de conseguir recursos. Orarei por você para que o Senhor abra os seus olhos.
 
- O QUE, PASTOR? Quem é você para impedir que eu ajude a minha igreja? Vou depositar esse dinheiro sim. A igreja não é sua! Você não tem o direito de fazer isso! Exijo que a igreja decida!
 
E, de fato, abriu-se uma assembléia de membros para tratar da questão. Diante da quantia vultosa da oferta e das necessidades pelas quais a igreja passava, ainda que o pastor expusesse de forma clara o ponto de vista bíblico sobre como ganhar dinheiro e como sustentar a Obra de Deus de forma lícita, o povo acatou o desejo do Petrônio e exigiu que se aceitasse a doação. O pastor, entristecido, ciente de que o povo estava julgando a questão na carne e pela cobiça, solicitou a sua exoneração da igreja, pois não poderia conviver com o desrespeito aos valores bíblicos da licitude de recursos e do bom testemunho desejado pelo Senhor aos seus servos. A congregação pouco ligou. Eles estavam felizes pelos muitos recursos que viriam. Petrônio ainda decidiu dar mais 5% como gratidão pela compreensão de todos.
 
O tempo passou. Petrônio divorciou-se da esposa e pagou pensão pelos 2 filhos que tinha. Comprou fazenda, casas e abriu 3 farmácias. Amaziou-se com uma mulher que lhe roubou grande parte do que tinha nas contas. Abriu um processo contra ela e gastou 2 farmácias e parte da fazenda. Com tantas contrariedades adoeceu e teve que tratar-se no exterior, consumindo o que restara. Em pouco tempo Petrônio estava pior do que podia imaginar: sem saúde, sem dinheiro, sem família. E a igreja, tão generosa com a oferta que recebera, agora não tinha princípios cristãos para usar para com ele, uma vez que aderira a um ministério neoapostólico e tornara-se rede de um embusteiro da TV. Todos os recursos que adquirira foram vendidos para pagar os programas de televisão e depositar na conta do apóstolo. O templo tornou-se oficina mecânica e os membros esparramaram-se por outras igrejas e pelo mundo.
 
O pastor? Ah, este continua pastoreando num bairro próximo. O pão não lhe faltou, os filhos estão na faculdade e a igreja está feliz. Afinal, quem tem Jesus e Sua Palavra é verdadeiramente rico e não se arrepende! A bênção do Senhor é que enriquece; e não traz consigo dores. (Pv 10:22)
 

Wagner Antonio de Araújo

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