quarta-feira, 17 de abril de 2013

memórias literárias - 66 - DE QUE TIPO SOU?


66 - DE QUE TIPO SOU?
Eis aí, no quarto de dormir, um rapaz recém-chegado da escola. Trabalhou duro até às seis, almoçou de marmita, passou quase duas horas em condução. É meia-noite e ele já tomou seu banho e jantou. Na escrivaninha um computador, um modem e a internet ligada. No monitor várias mensagens do Orkut e muitas luzes do MSN, são amigos a chamar-lhe. Ele não titubeia: deixa um recado de que amanhã responderá aos chamados. Desliga o monitor, abre sua bíblia e lê avidamente a carta aos Filipenses. Desde o início do ano ele se propôs a ler a bíblia todas as noites e marcar as coisas que mais calaram em sua alma. Seu novo testamento está todo marcado. Ele lê por 30 minutos. Agora dobra os joelhos junto ao leito. Ele ora. Está com sono. Então se levanta e ora andando. E diz: “Senhor, se eu não caminhar irei dormir, então andando falarei contigo”. E ora. Ora pela mãe, ora pelos irmãos, ora pelo trabalho, faculdade, colegas, igreja, conjunto, reavivamento. Chega a chorar quando apresenta a menina de quem gosta. Então, depois de um bom tempo ele diz amém e vai se deitar. “Em paz me deitarei e dormirei, porque só Tu, Senhor, me fazes repousar seguro”(Salmos 4.8).

Eis aí, na sala, uma dona-de-casa. Mulher sofrida, não tem dinheiro para pagar empregada. O marido labuta na firma e ela o faz em casa. Às vezes faz alguns salgados e lava algumas roupas para fora, mas os cuidados da casa lhe tiram as chances de ganhar mais dinheiro. Ela compensa com economia segura e sábia: consegue fazer render o que tem em mãos. Já lavou, passou, arrumou, escolheu feijões, temperou a carne, assou o frango. Ela já acordou as crianças, banhou-as, vestiu-as, colocou-as na perua que veio buscá-las. Já as recebeu de volta, deu-lhes outro banho, roupas limpas, deu-lhes brinquedos, deu-lhes janta. O esposo chegou cansado, ela o recebeu com amor, deu-lhe sua janta, conversou, arrumou as camas, viu o repórter, ligou para a mãe e a irmã, colocou as crianças para dormir, banhou-se e disse ao marido que não iria assistir ao jogo. Sentou-se na sala com a bíblia à mão. Bíblia surrada, usada, cheia de marcas do tempo, boletins antigos, cartinhas queridas, uma ou outra foto, até dinheiro havia lá. Mas também um óculos guardado no zíper da capa e uma caneta: ela lia a bíblia. Quantos versículos marcados com dizeres: “hoje precisei disto”, “desejo isso para meu marido”, “eu creio nessa promessa” , “reconheço que pequei”, etc. Lá está ela, depois de ter lido seu texto, seu devocional diário e até a lição da Escola Dominical. Junto da revista uma listinha: pedidos de oração. Muitos sinais em cada nome, registrando quantas vezes já orara por cada um. Cansada, no final da oração, cochilou e adormeceu. Seu marido a despertou gentilmente, e ela guardou sua bíblia e deitou-se em paz. “mulher virtuosa, quem a achará? O seu valor muito excede o de finas jóias” (Pv 31:10).

Eis aqui um pastor. Não está na cama. Não está na TV. Também não está no gabinete e nem tomando banho. Ele levantou-se na madrugada, três e meia da manhã, e foi até o quintal. Olhou as torneiras para ver se não vazavam. Foi ao quarto das filhas e verificou se estavam cobertas. Mediu a febre da menorzinha, já tinha passado. E então dirigiu-se à garagem, ao banco do seu carro. Sentou-se, colocou as mãos sobre o rosto e chorou. Sim. Chorou de soluçar. Enquanto chorava, sua mente dizia: “Pai, eu não sou suficiente para pastorear a Tua igreja. Dá-me a mão; dá-me a graça; dá-me o poder do Espírito Santo, para que o povo Te busque de fato e de verdade! Há tanta mentira, Senhor, tanta hipocrisia. Eu também tenho sido hipócrita! Me perdoe, Senhor! Me ajude a dizer não à preguiça de orar; me ajude a desligar a TV, internet e telefone quando em demasia; me ajude a amar o Teu povo e não apenas suportá-lo. Me ajuda a não medir o povo pelo dinheiro que dá, mas pelas pessoas que são: pecadoras como eu, e que precisam de forças Tuas. Renova-me, Senhor! Reaviva de verdade a tua Igreja”. Sua oração vai até às 5, quando então, depois de chorar, clamar, reclamar, lamentar, cochilar, resolve deitar-se mais um pouquinho, para então entrar em mais um dia nessa terra que o Senhor Deus lhe deu. “Se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, orar, buscar a minha face e se converter do seu mau caminho, então eu os ouvirei do céu, perdoarei o seu pecado e sararei a sua terra.”(II Crônicas 7.14).

 Você que é jovem, você que é dona-de-casa (ou profissional de carreira), você que é pastor, você que não é isso, mas é um ser humano também lutador e com uma vida a viver,  poderia encaixar-se nessa descrição que imaginamos? Exagero, não? Ninguém é tão espiritual assim! Ledo engano! Ainda há 7 mil joelhos que o Senhor conserva pelo mundo, de gente que faz valer à pena a existência das igrejas e a pregação do evangelho. "Também deixei ficar em Israel sete mil: todos os joelhos que não se dobraram a Baal, e toda a boca que não o beijou." (1Rs 19:18)

Serei eu um deles? Começando por mim, Deus aguarda uma resposta. Será que adoramos ao deus medíocre, de poder questionável e facilmente enganável? Ou será que adoramos ao Deus verdadeiro, que é Santo, é Justo, presente e adorado com racionalidade, espiritualidade e verdade? Pois em Sua palavra Ele diz que não quer ser cultuado por rituais ou locais santos, mas por homens quebrantados, que O reconhecem como Deus e que o honram interiormente, em espírito e em verdade. "Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional." (Rm 12:1); "Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem." (Jo 4:23)

Que tipo de crente eu sou?

...
==============

Wagner Antonio de Araújo
Igreja Batista Boas Novas de Osasco SP
bnovas@uol.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário

memórias literárias - 1477 - CHORA, Ó RAQUEL...

  CHORA, Ó RAQUEL...   1477   Quando o Senhor Jesus Cristo fez-Se homem, nascendo do ventre de Maria, Herodes o Grande desejou matá-Lo...